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Poesias e Crônicas

quinta-feira, 21 de abril de 2011

QUEM FOI JOÃO

João me ensinou tocar violão
João era um cara de estatura mediana, mas muita gente também é.
João era meio gordinho, mas e daí? Quem hoje não é??
Com seus quase setenta anos, apenas uma mecha de cabelos brancos que terminava em suas costeletas, contrastavam com a preta e reluzente madeixa, que era um tanto quanto mal cuidada.
João tinha uma fisionomia forte, era bonito e com cara de galã italiano.
João era um cara normal, pelo menos no aspecto físico.
Mas apesar do estereótipo de cara simples e normal, João era bravo, impaciente e intolerante, ácido as vezes.


João era inteligente, muito alias, talvez por isso o grau de intolerância era proporcional à inteligência.
Enquanto esteve em pé, João era "espartano", sagaz, voraz e extremamente inabalável em suas convicções e em suas posições.
João não abria mão, mesmo sabendo que poderia estar errado, João era difícil.
João também era bom, o problema é que João despejava todas as suas incompreensões e frustrações de maneira generalizada, isso atingia as pessoas, mesmo que a "munição" não fosse direcionada.
João era uma granada, e para "matar" o bandido ele explodia, e os estilhaços atingiam a todos.
As pessoas não compreenderam João.
As pessoas se afastaram um pouco de João.
João respondeu se trancando em seu mundo.
João era humano e tal qual todos os humanos, João caiu.
Uma queda forte, repentina, mas não uma queda literal.
João caiu com o glaucoma, que é um nome menos impactante que se dá ao câncer.
Mas João aprendeu com a dor, infelizmente como todos nós que muitas vezes aprendemos só com o incômodo e com a dor, geralmente é assim que nós humanos mudamos.
João começou a desconstruir todas as suas edificações e convicções morais.
João derrubou o muro que o cercava e construiu pontes.
João viu que nada é mais importante do que amar e ser amado, sei disso pois João me disse chorando: "Estou sendo carcomido pelo câncer, mas compensação devorando a cada dia porções e mais porções de amor". Eu chorei com João...Queria ter chorado mais.
João percebeu que é melhor ser feliz do que ter razão.
João era muito inteligente mesmo.
Aprendi muito com João durante os quarenta anos em que convivemos.
João me ensinou muitas coisas enquanto andava, mas aprendi mais com o João quando ele já não andava mais.
Aprendi bastante com o João seguindo seus passos, mas aprendi muito mais com o rastro da cadeira de rodas dele.
Fiquei mais tempo com o João nos últimos meses da doença, do que em toda a sua saúde.
João me carregou no colo quando eu era criança, e eu pude carregar João em meus braços também, de hospital em hospital.
João e eu perdemos muito tempo, perdemos tempo de nos amarmos mais, de vivermos mais juntos.
Mas João me perdoou, eu não precisei perdoar João, pois não havia o que perdoar, João era meu pai, e eu deveria ter sido um pouco mais "filho do João", mas no final tudo deu certo, nós nos amamos o suficiente nos últimos noventa dias de João.
Enfim, João se foi.
Hoje João já não briga mais.
Hoje João já não questiona mais.
Hoje João já não respira mais.
Ficou o aprendido com o João.
De como não ser, e de como ser.
Ficou a saudade do João.
Uma saudade que não sai.
Uma lembrança do João.
Uma eterna lembrança do meu pai.


Se você tem seu pai, se você pode falar com ele, escutar o que ele diz, agradá-lo, demonstrar um pouco ou muito de amor, faça isso pessoa, não espere mais.


Se ele está certo ou errado, isso é um detalhe tão bobo, que não merece nem um milésimo do preço da ausência de não termos mais o João, ou seja lá qual for o nome de seu pai.


Se você não tem mais seu pai, espero que possa pelo menos ter entendido a maravilhosa experiência de aprender com ele, no que fazer e no que não fazer.


Ah, e tem mais uma coisa...as vezes nós queremos ter bons pais, mesmo quando não sabemos ser bons filhos.
Se eu fosse você ligaria agora mesmo e diria: PAI EU TE AMO.


Liga lá...










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